Review: The Long Lead Story


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Cena de The Long Lead Story
Série: Studio 60 on the Sunset Strip
Episódio: The Long Lead Story
Temporada:
Número do Episódio: 5
Data de Exibição nos EUA: 16/10/2007
Data de Exibição no Brasil: 15/8/2007
Emissora no Brasil: Warner

Gostaria de iniciar esta resenha dizendo que poucas vezes assisti a um programa de TV ao mesmo tempo tão tocante e inteligente. Uma prova cabal de que crítica e reflexão, como preferirem, podem ser muito mais generosos do que costumamos imaginar.

Esta resenha dedico a ela, minha personagem favorita até o momento, Martha O´Dell, interpretada pela não menos maravilhosa Christine Lahti. Apesar de sua breve aparição na série, Martha representa o lado bom dessa confusão toda, um olhar de fora, mas ao mesmo tempo interessado, inteligente, sempre curioso (não fofoqueiro), inquieto e profundamente humano e afetivo. Com essas qualidades todas, tinha de ser uma mulher porque no ideário norte-americano são as mulheres de uma determinada geração e com um determinado porte que carregam esse olhar. No cinema descolado ela conquistou um lugar especial nos filmes de Woody Allen (Diane Keaton) e agora a televisão vem introduzindo-a com regularidade, talvez, porque através dela, o imprevisível, o surpreendente e o inusitado sempre adquirem uma profundidade maior.

No episódio anterior, Martha O´Dell foi introduzida como a jornalista da Vanity Fair que vai fazer a reportagem de capa da revista sobre o programa. A menção à revista e a presença da jornalista fazem bastante sentido no contexto da série. Juntamente com Harper´s Bazar e Vogue, Vanity Fair forma o trio das revistas ditas femininas, norte-americanas de moda, estilo e comportamento que ditam o gosto e o consumo das classes A e B. Há gerações, são elas que determinam o que deve ser vestido, calçado, comentado, lido, assistido, enfim, consumido e conhecido em termos do bom gosto de um público exclusivo norte-americano e global.

Fica implícito então, que o fato de Vanity Fair ter escolhido o programa para sua matéria de capa, não somente é uma excelente publicidade, mas, sobretudo, representa uma estratégia de marketing importante, que é Studio 60 buscar aproximação e mais associação com esse público mais sofisticado. Na verdade, um público que a televisão (aberta) perdeu, ao longo do tempo por confundir popularização com mau gosto e má qualidade.

Não resta a menor dúvida que Sorkin está entre os que acreditam que a crise da TV aberta deve-se em parte à perda de audiência das elites, no sentido cultural do termo. A esse respeito, nada mais elucidativo do que o estranhamento de Matt em relação às perguntas e os interesses de Martha. E não por acaso, já neste diálogo, Martha e Matt enunciam para o público o tema do episódio – autenticidade, valores – costurando-o delicadamente ao tema anterior da criatividade.

Em primeiro lugar, Martha foge do lugar comum do que poderia ser uma jornalista fofoqueira, atrás de escândalos. Em segundo lugar, ela se mostra genuinamente sensibilizada com o processo de criação e de como ele é revelador, não apenas da crise que atravessa o programa em si, mas de todo um modelo cultural e também de um certo padrão de moralidade nele implícito.

Matt:

Você cobriu campanhas presidenciais, você cobriu presidentes, cobriu guerras, por que está escrevendo sobre um programa de TV?

Martha:

Estou escrevendo sobre isso porque o que acontece aqui é importante. […] Eu acho que cultura popular em geral, e esse programa em particular, são importantes.

A essa altura, o diálogo entre ambos é interrompido pela entrada de um ator caracterizado de lagosta e isso não deixa de ser uma alegoria do que está acontecendo com essa cultura popular que tanto interessa Martha investigar e conhecer.

Mas Martha sabe também que ali acontecem coisas profundamente humanas. A crise existe porque existem pessoas, vidas e relacionamentos em jogo entre elas. E onde existem seres humanos, não apenas os relacionamentos adquirem peso, importância, como acabam orientando e influenciando as ações desenvolvidas por todos aqueles envolvidos. Esse é o caso da crise particular de criatividade de Matt e de tantos outros. Evidentemente o amor e as relações afetivas possuem um papel importante em nossas vidas profissionais. Martha confessa a Matt que quando se separou de alguém importante para ela, alguém de quem ela gostou de verdade ficou sem condições de escrever por algum tempo.

Mas Matt recusa as alusões de Martha para pensar sobre o que está acontecendo com ele. Temos aí o estereótipo da subjetividade masculina colocado de forma sensível, não como um clichê, mas como algo que tem um apelo cultural forte. Mulher experiente, Martha sabe bastante acerca dessa divisão sexual da sensibilidade e corre então ao encontro do outro lado da história, o lado feminino.

Enquanto Martha sai em busca do outro lado, assistimos a cena do bar onde Jordan (Amanda Peet) pede a ajuda de Danny (Bradley Whitford) para convencer o autor de uma série que considera importante a vendê-la para a NBS. Nesse momento o telespectador é informado sobre um outro tipo de dificuldade enfrentada por emissoras como a NBS: a imagem de respeitabilidade que elas possuem dentro do próprio meio. Ou seja, existe uma hierarquia entre elas, um ranking de qualidade estabelecido no próprio meio, por exemplo, a imagem de qualidade da HBO que a coloca no topo das emissoras, como um modelo e um paradigma de programação. Danny representa esse profissional que constrói seu capital de trabalho às custas de saber lidar com essa hierarquia. As razões da recusa de Danny em ajudar Jordan nesse momento são de certo modo reafirmadas pela seqüência das cenas de gravação de Studio 60. De fato, tal como ele, o telespectador percebe a distância que separa uma NBS de uma HBO.

Mas Studio 60 tem Harriet e é essa a história que Martha está atrás e vai descobrir para todos nós. Talvez naquela balbúrdia toda, ninguém ainda houvesse percebido, mas Martha com sua sensibilidade sabe que Harriet é especial. O que torna Harriet tão diferente? O fato de ser sulista, batista e, mesmo profundamente religiosa, ser uma excelente comediante? Isso é apenas o começo da história. Há algo mais na trajetória de vida de Harriet e Martha intui que nela reside algumas respostas importantes para a sua discussão sobre cultura popular. Citando um salmo, Harriet faz seu breve relato:

Harriet:

Era uma casa pequena. Com sete crianças. Uma mãe devota e um pai longe de devoto que começava a beber quando era dispensado da fábrica de papel. Eu era boa em quebrar a tensão. Minha mãe me botou nas peças da Igreja. Uma vez eu esqueci uma fala e para encobrir, fiz uma imitação da Judy Holliday. Todos ficaram em silêncio até que o ministro estourou de rir. Aí eu olhei e vi o orgulho no rosto de minha mãe. E eu lhe disse que estava pronta para receber Cristo. E eu fui batizada.

Martha:

Você se tornou uma cristã e uma comediante ao mesmo tempo.

Só por causa desse pequeno trecho de seu script Sorkin deveria receber todos os prêmios, porque nessas poucas palavras ele pôs um pedaço da América que Hollywood não cansou de apresentar ao mundo como um tipo de trajetória singular com a qual os norte-americanos se identificam profundamente. Na história de Harriet encontram-se entrelaçados valores, situações e sentimentos que dizem respeito a essa América e somente a ela.

Não satisfeita, Martha pergunta ainda a Harriet por que Matt estourou quando ela foi trabalhar no programa? Diz que não quer contar uma história de amor, mas apenas entender o que houve. Harriet responde que Matt é bom e seria descoberto de qualquer modo. O fato de eles terem se conhecido, se apaixonado e isso acontecer junto com o sucesso dele não passou de uma coincidência, não foi por causa dela, mas por causa dele. Nesse momento, Martha descobre ainda que Harriet, embora sendo uma artista e vivendo em Hollywood, ela continua sendo profundamente honesta, autêntica, ligada as suas raizes. Novamente o homem-lagosta aparece, talvez para sinalizar a singularidade de Harriet naquele ambiente.

De todo o modo, não á apenas Harriet que é honesta e está em busca de autenticidade. Outra mulher também carrega consigo esses valores, Jordan. Depois da conversa com Danny no bar, vemos ela numa reunião de negócios recebendo a proposta de compra de um reality show, baseado na idéia de que a vida particular de ninguém não resiste a um exame detalhado. Uma coisa nojenta, como ela mesma definirá mais adiante. Jordan sabe que um destino possível para a televisão aberta é realmente sucumbir à tentação orwelliana, mas ela recusa terminantemente o programa. Na queda de braços que se segue, Jordan é levada ao Presidente da NBS. Ao perguntar o motivo da recusa, Jordan diz que “quem colocá-lo no ar terá um grande papel em subverter nossa cultura nacional”. Diante dessa afirmação, temos aí uma outra grande frase de efeito dita pelo Presidente a Jack:

Se você quer que ela cozinhe, terá de deixá-la comprar os ingredientes.

Mas voltemos para Martha. Vêmo-la agora despedindo-se de Matt. Finalmente ela conseguiu a sua história, aquela sobre a qual vale a pena escrever:

Matt:

Sobre o que está escrevendo Martha?

Martha:

Não sei ainda. Sei que a metade desse país odeia a outra metade, e sei que por 90 minutos por semana, você e a Harriet ficam juntos. Você esteve aqui por dois anos antes de alguém saber seu nome. A Harriet chegou aqui e ambos estouraram ao mesmo tempo…

Matt:

Eu estava tentando impressionar a Harriet. Foi assim que estourei.

Enquanto isso, já chegamos ao fim do episódio com Jordan tentando convencer Trevor a vender seu roteiro de Nations para a NBS, com o argumento de que um show de qualidade deveria ser assistido pelo maior número de pessoas possíveis e que está na hora de mudar um pouco essa política. A essas alturas, Danny foi informado de que Jordan não aceitou comprar o reality show. Ele chega em tempo de convencer Trevor a fechar o negócio com a NBS. Ponto para Jordan que ganha assim o primeiro tempo do jogo. Resta saber se obterá realmente a vitória diante dos executivos da emissora: emplacar a audiência para Nations.

Cena de The Long Lead StoryE quanto a Matt e Harriet? Como símbolos das muitas e singelas trajetórias humanas que compõem o universo do show business, a lição é muito clara e, talvez, Harriet com sua autenticidade e simplicidade sulistas, sua fé batista, mesclada ao seu senso de humor suave seja a pessoa adequada para expressá-la melhor do que todos: não há criatividade possível quando nos afastamos dos nossos valores essenciais e dos sentimentos básicos que carregamos conosco ao longo da vida. Não é preciso dizer que a bela canção de amor cantada por Sting é uma reafirmação dessa eterna busca pela verdade e pelos velhos valores, nos quais um certo padrão moral não constitui um obstáculo, mas um convite à criatividade.

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  1. Rô Floripa - 28/08/2007

    Uau! A gente assiste ao episodio e adora, simplesmente adora. Dai vem ler a review e percebe exatamente porque adorou e nem tinha se dado conta.
    Laura, que texto! Parabens!

  2. Jaqueline - 28/08/2007

    Adorei o texto,reflete bem a delícia que é Studio’60.Amo as tiradas ironicas,as respostas rápidas,as piadas inteligentes e as discussões sobre a ética e a moral americana.E por ironia,daqui p/diante forma-se um arco que falará basicamente da guerra audiência versus conteúdo,(infelizmente,perdemos feio nessa).Tenho uma teoria que Studio’60 foi cancelada porque o governo americano assim determinou:vai que os americanos comecem a pensar de forma lógica?

  3. iran - 28/08/2007

    Um simples parabens, um texto primoroso, à altura de uma séreie primorosa.
    E volto a afirmar, não mais nos lamentemos pelo fim, e aproveitemos os mais (acredito) cerca de 15 episodios, eles com certeza tem mais qualidade do que muita serie que durou 10 anos…

  4. marco - 28/08/2007

    Laura, lindo review li com o mesmo sorriso embasbacado com que assisto a serie, é como disse a Rô, a gente gosta da serie e quando lê seu texto entende porque.
    Há algum tempo atrás, em alguns reviews de outras séries, tivemos discussões, porque alguns autores, faziam seus comentários, comentavam sobre as citações e situações da séries, mas não reseumiam o epi, já outros resumiam, mas não comentavam, o seu texto, foi uma grata mistura de comentário, resumo e observação.
    Por não ter HBO e não assistir Roma, não li seus textos anteriores, mas agora fiquei curioso.
    Parabéns !

  5. Henrique Martins Henriques - 28/08/2007

    Nós, os órfãos de Newsradio (esse é antigo) e The West Wing temos que aproveitar mesmo Studio 60.

    Ótima série, excelente resenha e, como observação: é impossível não olhar Martha O´Dell e não lembrar (até fisicamente) de C.J. Cregg…

  6. Ricardo - 28/08/2007

    Achei impressionante a comparação da TV aberta com a qualidade da TV Paga, no caso a HBO. Fascinante.

  7. Ricardo S - 28/08/2007

    Ótimo review Laura. Esse episódio foi matador, conseguiu ser romântico, emocionante e inteligente, sem ser pedante. O que foi aquela cena no balcão ao som de Sting? Bela e tensa ao mesmo tempo.
    O ep tem uma metalinguagem interessante, pq se Studio 60 não fosse escrita pelo Aron Sorkin e sim por um novato jamais teria chance na tv aberta.
    Henrique tive a mesma sensação, lembrei também da CJ. Duas ótimas atrizes por sinal.

  8. Thais Afonso - 28/08/2007

    Adorei o review Laura. Até lembrar desse episódio, que eu considero o melhor até agora, é regojizante. Sorkin criou uma série apaixonante, com personagens inesquecíveis, e além de todo o elenco principal, eu também sempre vou lembrar de Martha O’Dell, interpretada pela excelente Lahti, que deixou saudades depois que a também excelente Jack e Bobby foi cancelada.

  9. anderson - 29/08/2007

    Incrivel, a meçhor serie da temporada sem dúvida. Porém é inacreditável seu cancelamento. A NBC nã é de desistir assim tão facil de suas séries, realmente uma pena.
    2005 foi jack and bobby, 2006 everwood e agora studio. Que venham mais realitys shows….

  10. Daniela - 30/08/2007

    Nossa Laura, parabéns pelo texto. Perfeito. Sem duvida o melhor que já li, não só resumiu o episódio como fez uma leitura perfeita e muito bonita do que é studio 60.
    Não consigo deixar de lamentar seu cancelamento, mas concordo com Iran, aproveitemos até o fim essa raridade.
    PS: também lembrei da C.J… saudades!!

  11. Rafaelly - 31/08/2007

    Eu ia comentar justamente isso quando vi q a review falava bastante da Martha: ela é muito parecida com Alisson Janney e lembra muito o jeito da CJ mesmo…Ótima atriz…não a conhecia.

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